quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Criancinha

Só quem tem uma pecinha dessas em casa, sabe do que eu vou escrever.
O Dieguinho tinha oito aninhos e nunca tinha passado uma noite fora de casa.
Sequer dormira antes, na casa de algum parente.
Era um menininho frágil, branquinho, de cabelos encaracolados, com um olhar sofredor, sob um par de óculos bem redondinhos.
Muito mimadinho pela sua mamãe, era temporão, com mais de quinze anos de distância dos seus irmãos mais velhos.
No colégio tinha poucos amiguinhos e vivia grudado na barra da saia da professora.
As aulas de educação física eram um inferno, pois não gostava das brincadeiras esportivas, nem das atividades de sociabilização, promovidas pelos educadores.
Sempre arrumava alguma doença ou desconforto, nesses momentos, para sair da quadra para o aconchego seguro da enfermaria (e também da enfermeira, que parecia a vovó Dolores).
Até que, em um lindo dia, sem entender muito bem o porquê, a sua mamãe, resolveu mandá-lo para um acampamento de três dias, que acontecia todos os anos, em uma cidade do interior do estado.
O menininho pediu que a sua mamãe relevasse a indelével decisão, mas ela estava firme nos seus propósitos em mandá-lo para Tatuí, com o seu colégio.
O garotinho chorou, ameaçou uma síncope, gritou e ajoelhado, implorou...
Mas, a sua querida mamãe não voltou atrás.
Foram os dois até a escola e após conversarem com um dos coordenadores, ficou decidido que, se o Dieguinho não conseguisse sobreviver por mais de um dia, longe da sua amada família, ele poderia voltar para casa, acompanhado de alguma professora (ele nem desconfiara que aquela promessa era só um paliativo para acalmá-lo).
Depois de uma torturante semana, chega o dia da viagem.
O menininho chega ao local de embarque, acompanhado apenas pela sua mamãe, que logo o coloca no ônibus e desaparece.
Dieguinho já começa a sentir saudades, desde aquele momento e nem as brincadeiras dos monitores o distraem.
Mas, "tudo bem", pois era só chegar no acampamento que ele pediria para voltar.
Viagem tranquila e ao chegar no local, ele recebe uma notícia terrível.
A professora lhe informa que não há sinal de celular naquela área.
Então, como ele poderia conversar com a sua mamãe e pedir para voltar?
Isso gerou cenas dignas de um dramalhão mexicano, com muita paciência por parte de toda a equipe de professores que estavam no acampamento.
Noite terrível, manhã pior ainda.
Mas, na hora do almoço, uma esperança.
O Dieguinho viu um grupo de ônibus e vans que acabaram de chegar no local para buscar alunos de uma outra escola.
Ele sorri e esbanjando simpatia (mas com a sua tradicional carinha de sofrimento), sai perguntando de motorista em motorista se ele poderia pegar uma carona até a capital.
Só desistiu quando percebeu que os motoristas não estavam muito a fim de levá-lo de volta até a sua mamãe e a coordenadora já muito impaciente o recoloca de volta nas atividades.
Atividades, inclusive que, além de o distrairem, na maioria das vezes o assustavam.
Quase teve um ataque cardíaco ao ver o fóssil de um Tiranossauro Rex e ficou paralisado ao ouvir o som de algum bicho enorme no meio do mato (ele nem tinha percebido que o rugido vinha de uma enorme caixa de som).
Em uma pequena trilha que avançava sobre um riacho bem transparente, com água na altura das suas canelas, o Dieguinho percebeu que estava sendo seguido por alguma coisa vermelha.
Quando ele se movimentava, "a coisinha rubra" se movimentava também.
Ao parar, aquilo ficava estático ao seu ladinho.
Frente a aquela situação ele desesperou-se e começou a gritar, saindo correndo pelo minúsculo curso d'água, com o troço avermelhado o acompanhando, na mesma velocidade.
Só acalmou-se ao saber pelo monitor, que aquele ser escarlate que o incomodava, era nada mais, nada menos, que o seu próprio tênis.
E assim, passaram-se os outros dias e o Dieguinho pode voltar para casa.
Aliviado ele vê a sua mamãe na porta do colégio e lhe dá um abraço de urso, daqueles que parecem que não vão acabar nunca mais.
A mamãe deixa-o no carro com o seu irmão mais velho e volta até o ônibus para agradecer aos professores a paciência, o carinho e a atenção com o seu caçulinha.
E, com um sorriso marcante, arremata:
- "No ano que vem, vou mandá-lo de novo..."

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