terça-feira, 20 de setembro de 2011

Espectador

O Edniz é um especialista em cantaria na cidade de Mariana, nas Gerais, e como aluno do grande mestre Juca (que nos dá muita saudade da sua ausência) estava concluindo um trabalho de restauração de um chafariz localizado na parte central da cidade de Ouro Preto.
Como ele prefere fazer o restauro no próprio local, como forma de conscientizar a população (que é quem mais destrói) da importância da preservação do valioso patrimônio, sempre tem ao seu redor uma pequena multidão de curiosos e admiradores, principalmente porque a arte que ele executa é extremamente delicada e vigorosa, já que trabalha com pedras de dureza mais elevada que as tradicionais, como o quartzito e o granito.
Em um dos dias que tinha começado mais cedo o trabalho, parou ao seu lado um senhor com chapéu e guarda-chuva a tiracolo e ficou observando ele tirar lascas pequenas da pedra, com todo cuidado, pois uma marretada mais forte poderia colocar a perder todo o trabalho do mês.
O velhinho apurava a visão depois de cada golpe e tentava enxergar o que estava sendo esculpido.
Perguntava algumas coisas e recebia respostas imediatas, que aos poucos iam acabando com a paciência do Edniz.
E sempre observava que "faltava força para o escultor", pois ele só "conseguia tirar algumas lasquinhas por vez".
Nem adiantava ficar explicando muita coisa, não, pois o que o artista mais queria era que o observador fosse logo embora.
E o tempo foi passando e nada dele sair...
Até que, já sem paciência e com a concentração muito baixa, o escultor deu uma martelada mais forte na ferramenta e tirou um pedaço enorme da peça, destruindo praticamente todo o trabalho.
Irritadíssimo, ele olhou para o exigente observador, com cara de pouquíssimos amigos.
Sem pestanejar o senhorzinho voltou à sua posição ereta e sentenciou:
- "Agora sim! Finalmente dessa vez, você conseguiu tirar um pedação. Tava faltando força mesmo..."

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Joguinho

No colégio onde trabalhei havia no pátio, muitas mesas de pebolim (ou totó, como chamam os cariocas).
É a diversão dos alunos.
Muitos, inclusive, ao ouvir o sinal do final da aula que antecede o intervalo, saem correndo, alvoroçados, pelo corredor para conseguir um bom lugar na fila do mesmo.
Como são poucas mesas e muitos alunos, gasta-se boa parte do recreio para conseguir participar de uma mísera partidinha com os amigos.
E, é tão impotante conseguir um bom parceiro, que o prêmio para os vencedores da peleja é continuar na mesa, até ser derrotados por alguém ou ser retirado por algum dos inspetores do colégio.
Como a turma dos pequenininhos estava abusando do direito de descer rapidamente as escadas para conseguir um bom lugar para as partidas, acabou sendo repreendida pela Odete, a coordenadora de disciplina do colégio (isso mesmo, coordenadora de disciplina), que teve que entrar em uma das salas que mais abusava da correria para dar uma bronca geral.
Pediu licença ao professor de história e foi direta ao assunto.
Que era um absurdo tal comportamento de alunos daquela idade, que mais pareciam criancinhas do maternal e blá, blá, blá...
Até que, para finalizar o seu discurso, sentenciou sem dó nem piedade dos pequenininhos:
- E, de agora em diante, como castigo, vocês estão proibidos de brincar com o "pingolim"...
Já pensou se algum deles não percebeu que ela confundiu os nomes?
Vai atrapalhar o seu desenvolvimento natural...