terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Seu Elpídio

Seu Elpídio viveu boa parte da sua vida em uma cidade do interior de São Paulo.
Na década de 70, mudou-se para a capital, mas nunca se esqueceu das suas origens, pois sempre voltava pra rever os amigos e parte dos familiares que ainda haviam ficado lá.
Foi contador (na época ainda chamavam de "guarda-livros") e dono de mercearia.
Sempre amou o time da cidade.
Foi presidente do clube por um mandato.
Foi responsável por obras importantes nesse período, como a construção de uma arquibancada de madeira para o modesto campo, localizado no centro da cidade e manteve sempre um time competitivo, mesmo só disputando campeonatos amadores.
Chegava a se exaltar e até a brigar pelo seu time do coração.
Em um desses acirrados campeonatos regionais, com o time disputando a liderança, ele acompanhou os seus jogadores até uma cidade vizinha, menor em tamanho e economia, que a sua, mas com uma grande rivalidade que, óbvio, também se estendia aos gramados.
O jogo começa bem disputado, mas aos poucos, o time da casa começa a dominar a peleja, marcando um gol.
E a torcida não perdoa.
Como o alambrado era muito próximo do campo, alguns torcedores vão até o banco de reservas da equipe visitante (onde estava seu Elpídio) e começam a fazer troça com os integrantes da comissão técnica.
O nosso ilustre presidente, já muito irritado, enrola um pedaço de jornal no formato de tocha, coloca fogo com o cigarrinho de palha que estava fumando e mostra para a torcida.
Como para bom entendedor, "pingo é letra", a torcida logo entende o recado.
Seu Elpídio mostrava a tocha de jornal aos torcedores, em referência à "lanterna" que o time da casa segurava no campeonato (em referência ao último lugar da equipe).
Não podia acontecer coisa diferente: a torcida ficou furiosa, empurrando a tela do alambrado, querendo invadir o campo para pegar o nosso ilustre protagonista.
Para evitar mal maior, o policial que estava presente no local, dirigiu-se até o banco de reservas e "convidou gentilmente" o ilustre presidente da agremiação visitante a acompanhá-lo.
Seu Elpídio deixou bem claro que só sairia de campo, acompanhado pelo delegado da cidade (ele sabia que o mesmo não estava presente).
O policial ficou irritadíssimo, pedindo respeito à autoridade presente (no caso a dele).
O "quase preso" não pensou duas vezes e soltou a máxima:
- "Desde quando soldado é autoridade?"
O ofendido levantou o cacetete para bater no inoportuno senhor, mas foi contido pelos jogadores reservas do time visitante.
Como o tempo ameaçou fechar, naquele modesto campo de futebol, os dirigentes da casa resolveram contemporizar e pediram ao policial que relevasse o desacato.
Com a situação resolvida, o jogo chegou até ao final e, com a derrota da equipe, o nosso ilustre herói volta para casa mais triste.
Mas, quase duas décadas depois, em 1977, ele estava presente na final do campeonato paulista da segunda divisão, agora como torcedor, para ver o seu time do coração, subir para a primeira divisão.
O campo já era outro, muito maior, bem diferente daquele que ele tinha feito as modestas melhorias, mas que agora lhe trazia uma das últimas alegrias futebolísticas do seu time do coração...

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