sábado, 3 de abril de 2010

Toninho

Nesses dias de intenso trabalho, em que não tenho tido tempo para quase nada, dei-me uns minutos de reflexão sobre outras épocas, onde trabalhava-se menos e vivia-se muito mais intensamente.
Revivi, em pensamento, um pedacinho do final da década de noventa, ao lado de um grande e inesquecível amigo: o Toninho.
Grande não só na estatura ou na simpatia, mas também na lealdade que uma boa amizade necessita.
O cara era notado onde passava, mesmo quando não se conseguia vê-lo.
Falava tão alto que, da sala dos professores do colégio, conseguíamos perceber que ele estava adentrando no mesmo.
Era o rei da simpatia, pois conversava com todos e com tudo (mais de uma vez peguei ele esbravejando contra o computador, que teimava em não atendê-lo).
Sempre tinha um comentário pertinente para qualquer situação que vivia ou que lhe contassem.
Era muito engraçado, mesmo quando não queria sê-lo.
Vivia situações que só aconteciam com ele.
Em uma visita à Florianópolis, sua terra adotiva, pude perceber o quanto era importante para ele o respeito entre as pessoas.
Primeiro porque ele se julgava o rei de Floripa (e era mesmo). Depois porque ele odiava o jeito desrespeitoso de alguns gringos em relação aos manezinhos, os nativos da ilha.
Tinha birra especialmente de "nostros hermanos portenhos".
Em um sábado nublado e de pouco movimento na praia da Barra da Conceição, estávamos sentados em uma agradável barraca, na areia, quando surgiu um grupo imenso de argentinos, indo do calçadão em direção ao mar.
Meu amigo, logo que visualizou o grupo, já torceu o nariz e comentou em voz alta: esses caras acham que são os donos da praia!
Fiquei um pouquinho apreensivo, pois percebi que eles iam passar justamente do nosso lado.
Não deu outra, pois quando a trupe portenha cruzou a nossa mesa, nos jogou bastante areia, com os seus chinelões e seu andar arrastado e insolente.
O Toninho levantou-se indignado e gritou com o grupo que já se afastava:
- "Hei, cambada! Onde vocês pensam que estão? Aqui é o Brasil, seus vagabundos. E se não quiserem levar uma surra tem que aprender a se comportar."
Claro que as palavras não foram bem essas, mas mesmo não as reproduzindo "ipsis literis", acho que deu para se entender a indignação do meu amigo.
Eu também me levantei e quase que implorei para ele:
- "Deixa disso, cara, pelo amor de Deus! Eles não fizeram de propósito não!"
Na mesma hora, o Toninho me respondeu com aquela voz rouca e num tom audível em toda Florianópolis, que faria aqueles caras respeitarem as regras do local, nem que fosse na marra.
Quando vi que o grupo parou e que voltou em nossa direção, pensei na estratégia de pegar uma cadeira, acertar um deles com toda a minha força e sair correndo como nunca fiz em toda a vida.
Mas, para o meu espanto e deleite total do meu amigo, o mais cabeludo deles se aproximou e, em nome do grupo, se desculpou educadamente pelo gesto deselegante dos seus amigos.
Então eles retiraram os chinelões e, com eles nas mãos, seguiram o seu caminho de cabeça baixa até a areia mais dura, nas proximidades da água.
Juro que ouvi até aplausos de alguns banhistas nas mesas ao lado.
Nem precisa dizer que o meu grande amigo, agigantou-se ainda mais e me mostrou, de verdade, o que era ser o "rei da praia".
E, que hoje, sinto muita saudade da sua amizade.
Um forte abraço, meu rei!

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